Hoje o dia foi igual aos outros…
O meu colega de trabalho é presunçoso.
Ai, a Beatriz anda a comer doces.
Sem ler, começo a ficar pouco inteligente.
A L. é culta e tão assertiva.
A entrar nos 40 já devia ganhar o dobro e ter reconhecimento, pelo menos, nacional.
A minha barriga nunca mais ficou a mesma depois da gravidez.
Havia de ir duas vezes por semana ao ginásio.
São as preocupações tão sérias que às vezes me perturbam o espírito.
Preocupações que em vez de o elevarem e lhe recordarem que pertence ao céu, o prendem à terra.
Preocupações de quem tem um dia rotinado.
Preocupações de quem se pode afastar perfeitamente dos homens que não a respeitam.
Preocupações de quem tem uma oferta demasiado grande de alimentos para colocar no prato da filha e no seu próprio prato.
Preocupações de quem tem dinheiro para livros e excelentes bibliotecas à disposição.
Preocupações de quem tem um trabalho que lhe permite viver condignamente e em que pode, por vezes, efectivamente, fazer a diferença.
Inês Pedrosa, neste artigo, fala deste nosso culto civilizado de suspirarmos tristes e insatisfeitos.
Hoje em dia, se respondemos “Estou óptimo!” temos de ser meio-tontos ou insensíveis ou lunáticos.
Afinal se não controlamos tudo, não podemos tudo, não temos tudo… como podemos estar felizes?
A escritora descreve a lição dada por um professor de ex-meninos soldados:
“No fim de uma aula no mato – com a terra como caderno e pauzinhos de árvores como lápis – , um professor descalço veio oferecer-nos um pé de laranjeira, dizendo, num sorriso radioso:
«Para vos dar felicidade».
Entendi naquele instante que a douta e talentosa Yourcenar não tinha razão: não, a felicidade não é um sub-produto; só quem a tem nas mãos (casa, comida, paz, livros, adulações) pode divertir-se a despedaçá-la, com uma ferocidade infantil.
O professor descalço de Moçambique sabia isso. Aprendera o valor de estar vivo e de partilhar o seu conhecimento com garotos regressados do inferno terrestre. Aprendera a saborear o prazer de uma laranja. E não sofria da infelicidade sofisticada de que terá sofrido o misterioso Shakespeare (que completa em Abril 400 anos) e de que sofremos todos nós, os ungidos pela civilização do dinheiro, da fama e do espectáculo: a de invejarmos ou sermos invejados.”
Lembrete:
“Mas já é tempo de deixarmos de reverenciar a desgraça enquanto sinal exterior de inteligência:
não há nada tão burguês, confortável e conveniente como o culto organizado da infelicidade. ”
Imagem : a perseguir balões de ar, quando a perfeição das plantas está ao nosso alcance…
14 de Março de 2016 às 13:31
Adorei, Ana. 🙂 Beijo e boa semana, com muito sol
15 de Março de 2016 às 11:59
Uma semana muito luminosa, Joana!
15 de Março de 2016 às 17:05
Olá Ana !
Tão verdadeiro !
Toca a valorizar o que temos…e aprender a ser felizes .
Gostei muito e subscrevo !
Boa semana !
Beijo,
José
16 de Março de 2016 às 11:21
Olá, José!
Às vezes, no correr dos dias esqueço-me do essencial…
É uma questão de treino e o post funcionou como uma cábula para mim.
Que bom que também seja a tua 🙂
Um abraço,
Ana
Pingback: Solidez |
24 de Março de 2016 às 23:52
Olá, Ana!
As tuas descobertas são sempre uma revelação. Palavras tão bem alinhadas e atentas à realidade.
Um grande beijinho,
Mia
26 de Março de 2016 às 10:06
Uma Páscoa muito Feliz,Mia!