Janeiro é altura de balanços e, por isso, costuma ser um mês duro e frio.
Ainda que seja optimista, fico sempre focada nos vazios inevitáveis da vida.
No início de 2020, o balanço coloca num dos pratos toda uma década.
Que peso!
Foi, contudo, a década mais intensa, feliz e desafiante da minha vida.
Em 2011, fui mãe e podia nem escrever mais: transformei-me, preenchi a década e o coração.
Nada fica como dantes quando nos irrompe a mogli pela vida.

A partir daí, toda a década se conjugou na primeira pessoa do plural.
Em 2013, mudámos de casa e passámos a viver em Estremoz. Foi difícil.
Demorou até adoptarmos a cidade, mas ajudou o facto de uma de nós ser meio alentejana: a mogli, agora mais crescida e grande companheira de viagens.

Tomo consciência, com ela, de que ainda é necessário educar para o feminismo.
Estou alerta e percebo que o quotidiano nos exige, sem pudores, esforços de super-mulher e que, de facto, o somos, mas de outra forma. Somos super-mulheres quando impomos a nossa vontade, quando dizemos “não”, quando fechamos a cara e quebramos expectativas, pressões e convenções. Sei que o caminho de educar para a autenticidade só está a começar.

Este blog nasceu, em 2013, também porque fui mãe e quis, num determinado momento, documentar o nosso lado luminoso. Entretanto, fomos crescendo (eu, a Beatriz e o blog) e este espaço ganhou muitas outras vertentes. Eu também as adquiri, enquanto mãe e mulher.
Estou mais lúcida e contemplativa, embora continue hesitante e sem perceber algumas encruzilhadas da vida.
Antes dos 40, intrigava-me a melancolia dos mais velhos, quando ficavam muito tempo em silêncio a olhar para o vazio ou a observar uma chama ou uma paisagem. Agora já descobri o que fazem: colocam em ordem os pensamentos e tentam orientar-se numa (cada vez maior) teia interior. Nos dias em que não consigo essa pausa, sinto-me impaciente, esgotada e perdida.

Nem tudo correu bem nesta década, houve perdas pelo caminho.
Perdas profundas e que não resultaram da minha vontade.
Aprendi a dar-me tempo para aceitá-las.
Numa época em que tudo tem de ser rápido e intenso mas superficial, não aceitamos de ânimo leve que sarar feridas demora… Enfim, a triste realidade é que se ignorarmos a dor, corremos o risco de nunca a cicatrizarmos.
Aceitar, sofrer, respirar e avançar é o meu lema. Mas proteger-me também, ao contrário do que me acontecia quando tinha vinte ou trinta anos. Agora, permito-me ter alguns medos, selecciono as lutas e cuido-me, afastando-me de quem me faz mal (ainda que involuntariamente).
Se tudo correr bem, o caminho ainda vai ser longo, com subidas íngremes, mas algumas planícies onde conto descansar bem acompanhada.
Boa jornada e boa sorte para a próxima década!
11 de Janeiro de 2020 às 23:36
Fiquei cá a pensar, minha cara Ana que nos conhecemos e somos estranhas há tempos. Me lembrei do tempo da correspondência, onde eu experimentava pessoas e lugares que chegavam em envelopes, hoje chegar através do ecrã… gosto de ti, desse lugar e saber-te através dos tempos. Catarina começou no mesmo ano que o teu Frasco e tantas vezes já dialogamos… uma delícia isso. O teu é um dos poucos blogues que não ficou pelo caminho e me chama ao diálogo. Grazie por isso…
11 de Janeiro de 2020 às 23:52
Lunna, muito obrigada pelas palavras, pela presença e pela estima.
Que coincidência! Não tinha a certeza de que os nossos blogues eram coincidentes no tempo 🙂
Gosto do nosso diálogo! Solto e afectuoso!
Um abraço forte!
1 de Fevereiro de 2020 às 2:21
Maravilhoso, Ana, me identifiquei tanto! Pra mim foi uma década bastante intensa também, mas de enorme aprendizado. Talvez o maior deles tenha sido não ter pressa, mas não perder mais tempo com aquilo que não importa. Avante! Bjo
1 de Fevereiro de 2020 às 16:20
É um excelente lema de vida, Helka! Vou adoptá-lo!
Um abraço!