Na escola da Beatriz há algumas meninas, mais velhas, que mostram os vestidos novos quando chegam.
A L. veio passar a tarde connosco e, na sua timidez, perguntou-me se eu já tinha visto as suas “leggins” de ganga.
Eu sou vaidosa, mas fiquei tão espantada que nem percebi logo a questão.
Entretanto, a Beatriz andava em plena loucura de rega no quintal com galochas e cheia de lama.
Não sei como vai evoluir a Beatriz, mas por enquanto ainda usa o meu baton com a mesma naturalidade com que “faz a barba” com o Pai, lê livros, faz bolachas, chapinha no quintal ou salta nos colchões.
É uma fase essencial do desenvolvimento, da construção de modelos e do autoconceito.
Nem todos os pais pensam muito nesta questão;
de outra forma não proliferariam tantos vestidos, acessórios e bugigangas rosa-choque (de gosto muito duvidoso)
e outras tantas princesinhas animadas que mais não fazem do que suspirar pelo seu príncipe e enfeitar-se a si e ao que as rodeia.
Na pouca televisão que vemos, há uma distinção clara entre animação para meninos e animação para meninas.
E a questão é: o que pretendemos nós, adultos, do futuro dos nossos filhos?
Num mundo perfeito, os filmes de animação, para crianças, seguiriam, prioritariamente, padrões de qualidade:
haver um protagonista ou uma protagonista era secundário – qualquer criança identificava-se com a missão do herói, com os seus medos, com a sua bravura e desenvolvia a vontade de construir uma equipa e viver as mesmas aventuras, quer o líder usasse tranças ou cabelo à escovinha.
Não é assim.
E os produtores de cinema vivem e alimentam (-se de) preconceitos.
Gostei muito desta intervenção de Colin Stokes, no TED: “The Hidden Meanings in Kids´Movies: um pai que começou a despertar para estas questões, com a filha e com o filho.
Dos 100 filmes produzidos em 2011, nos Estados Unidos, quantos tinham uma protagonista feminina?
11!
Com algum humor, Colin aconselha-nos a fazer o teste Bechdel:
1- O filme inclui duas personagens femininas?
2- Essas personagens falam uma com a outra?
3- O tema da conversa vai para além do rapaz por quem estão apaixonadas?
Quero um futuro com mulheres que vivam a vida intensamente, incluindo a amorosa;
mas que nunca se sintam limitadas ou se autolimitem por serem mulheres;
que pensem no que vão vestir no dia seguinte, mas que não seja só esse o objectivo do seu dia!
Uma em cada cinco mulheres, nos Estados Unidos, já foram sexualmente ofendidas.
Onde aprenderam os rapazes esse comportamento?
Colin Stokes aponta responsabilidades:
Os meninos crescem num universo em que o herói tem de vencer o inimigo com violência e, no final, recolher a recompensa:
“the girl” – de preferência uma que não fale muito!
Que imagem de poder estamos a dar aos meninos/rapazes?
Por todos estes motivos é importante repensar que filmes vemos em casa:
com protagonistas que meninos e meninas queiram como amigos e que não reiterem o sarcasmo contido na frase “coisas de menina”.
E quase todos os de Miyasaki!
Mais sugestões?