Pró Pudor
Nos braços, com brandura gasalhosa;
Todas as noites eu adormecia,
Sentindo-a desleixada a langorosa.
Lhe emanava da fronte imaginosa;
Todas as noites tinha uma mania,
Aquela concepção vertiginosa.
Ela tinha um furor dos mais soturnos,
Furor original, impertinente…
Descalçava-me as botas, os coturnos,
E fazia-me cócegas nos pés…
Cesário Verde, in O Livro de Cesário Verde .
Numa sociedade tão sexualidade, precoce e assustadoramente sexualizada, pouco se fala de intimidade.
Intimidade requer tempo, dedicação e muita persistência;
palavras pouco em sintonia com a rapidez dos dias e com a efemeridade e superficialidade da maioria das nossas relações mundanas.
Intimidade é resmungar, saber que há dias maus… mas acreditar, no íntimo, que o companheirismo e o amor os superam.
É saber que estarmos todos os dias juntos é maravilhosamente tranquilizador, mas que também implica saturação e algumas lutas periódicas… com o outro e connosco.
Intimidade é dar razão aos mais velhos quando eles dizem que ” é preciso muita paciência” e “morder a língua” para não magoarmos o outro só porque estamos exaustos de um dia duro.
Intimidade é saber que a maior parte dos dias não é digna de um anúncio da Coca-Cola, com abraços ao pôr-do-sol, mas ainda assim não querer ir para outro lugar.
Às vezes, até é querer ir para outro lugar, mas essa vontade desaparecer passados 15 minutos.
Intimidade é conhecer o outro e reconhecermo-nos quando estamos com o outro;
é soltar gargalhadas no mesmo segundo;
sentir os silêncios serenos;
comunicar de todas as formas e “querer bem”… sempre.
Intimidade talvez seja, como diz Cesário, “cócegas nos pés”… e na alma.
Imagem Happily Grey.
P.S. A Lunna diz que intimidade é “cafoné na alma”!
É mesmo!