Foi um Verão feliz.
Fomos agraciados com a Leonor e retemperámo-nos longe de notícias assoladoras.
Esta praia é perfeita para o reencontro.
Penso muito nela durante todo o ano.
Recordo-a, seguindo a dicotomia de que Sophia fala: praia/mundo, num poema que me é recorrente e com o qual mantenho uma relação circular: quando leio o poema, lembro-me desta praia e, quando piso esta areia, ouço a Sophia.


Eu me perdi
Eu me perdi na sordidez de um mundo
Onde era preciso ser
Polícia, agiota, fariseu
Ou cocote
Eu me perdi na sordidez do mundo
Eu me salvei na limpidez da terra
Eu me busquei no vento e me encontrei no mar
E nunca
Um navio da costa se afastou
Sem me levar


Gosto de beber café numa esplanada e observar uma praça movimentada, mas na praia prefiro estar sozinha com os “meus”.
Estamos despidos e expostos, longe da “sordidez do mundo”.
É o tempo de encontrar a nossa pele, sempre escondida por baixo de roupas e máscaras (agora até literais).
A praia da Murtinheira, na Figueira da Foz, é nossa: a praia da infância, das longas caminhadas confidentes e dos dias bons.
Uma praia com poucos apreciadores, mesmo em pleno Agosto, ao meio-dia: a água gela os ossos, o nevoeiro custa a levantar e as ondas são traiçoeiras e, geralmente, furiosas.
É a praia dos amantes de Geologia, mas não é o spot dos sunsets.
Ao longo destas falésias do Cabo Mondego, observa-se “o maior afloramento do Jurássico da Europa; concretamente, na praia da Murtinheira encontra-se o estratotipo da passagem Aaleniano-Bajociano”.
Na minha profunda ignorância, pressinto mundos ancestrais nestas falésias – passearam por aqui dinossauros – mas contento-me em explorar as grutas, na maré baixa.


Chegou Setembro e, agora, terei de ser, novamente, “polícia, agiota, fariseu ou cocote”, mas tatuo a mensagem de sobrevivência:
“nunca um navio da costa se afastou sem me levar”.
12 de Setembro de 2020 às 23:57
Lugares inspiradores e inspirados!
13 de Setembro de 2020 às 17:35
São os ideiais para tomar fôlego para os meses duros que teremos pela frente!
Muita força, Dulce!
13 de Setembro de 2020 às 15:45
Adoro o contato com o mar e percorrer a orla de uma praia deserta.
Me deliciei através de suas fotos e narrativa. Há muitas formas de se viajar!
13 de Setembro de 2020 às 17:37
É mesmo isso, Roseli! Guardar as nossas memórias felizes também nos permitirá viajar nos dias mais duros!
Estranhos tempos estes!
As praias desertas talvez nos salvem, pelo menos da insanidade mental!
17 de Setembro de 2020 às 13:04
Ah, eu estou com saudades de andar a cidade, percorrer minhas paisagens… é a minha praia. É a fonte da minha renovação. Mas ando com preguiça de pessoas e de seus comportamentos “virais”.
Então fico a casa e espio a janela. Saio apenas para o necessário. Me adaptei ao casulo, por sorte tenho um mundo que chega (como o seu post) e me leva para longe de tudo isso. É uma fuga e ainda que temporária, faz-me tão bem.
bacio cara mia
17 de Setembro de 2020 às 19:40
Lunna, ter um mundo nosso para onde fugir é mesmo o fundamental.
Também ando muito saturada de comportamentos virais
Bacio!